Friday, August 20, 2010

Por que ainda somos os mesmos

Fui assistir ADOLESCER a convite de uma tia que, por sua vez, foi convidada por José Outeiral, supervisor do espetáculo. Nem sabia que existia esta função... Não teria ido por conta própria. Talvez, porque esta fosse uma época da minha vida da qual não sinto exatamente falta. Não sabia quase nada de sexo, tinha discussões homéricas com meu pai, não gostava do meu corpo e era ridicularizada na escola. Não saber o que fazer no futuro me angustiava a ponto de me deprimir. Pronto. Fiz um resumo deste período, na minha ótica, daquele tempo.
Mas foi ótimo ter ido. Primeiro, porque o elenco é muito bom. E não me peçam para explicar o que este adjetivo exatamente quer dizer. Eles são expressivos, dizem os textos de maneira convincente e dançam maravilhosamente bem. Além disso, fazem mais de um papel ao mesmo tempo e são bons em todos eles. O nome da diretora, Vanja Ca Michel não me é estranho, mas pouco sei dela. Trata-se da diretora deste espetáculo que reúne 15 atores, entre estes, João Carlos Castanha. Este sim, meu conhecido. O nome, quero dizer.
O teatro Bruno Kieffer estava, praticamente, lotado. Na maioria, adolescentes. Dava para ver que eram grupos organizados, trazidos, especificamente, para ver o espetáculo. Aliás, achei que seria difícil assistir ao espetáculo com toda aquela agitação. Falavam alto, se mexiam nas poltronas. Não pareciam acostumados com o espaço. Uma professora sentou do meu lado. Tentou, no início, coibir os movimentos e a falação. Pensei que isso seria ainda pior. Lembrei direto da Bienal quando os alunos ficavam excitados com a provocação dos artistas e que os responsáveis vinham com suas ordens, com seu autoritarismo tentar proibir as reações. Além de não conseguirem, só aumentavam o tumulto. Felizmente, ela logo se acalmou. E não foi só ela. Toda a plateia. Pude perceber, claramente, que a dança inicial, as primeiras aparições dos atores e atrizes iam levando os adolescentes presentes para uma atitude de respeito e atenção ao que estava acontecendo no palco. Isso já demonstrava a estratégia bem sucedida da direção.
Quanto ao resto, acho que não me cabe dizer se os temas estão sendo bem tratados ou não. Mas, também não posso deixar passar em branco as informações sobre as questões sexuais. Há muito tempo (estou perto de completar meio século), me indigna as formas equivocadas de tratar homens e mulheres e suas relações. Sempre foi assim. Desde menina. Para mim, sempre fomos todos seres humanos antes de qualquer outra diferença. Então, ainda me agride pensar que em pleno século XXI ainda tenha que se registrar que as meninas que fazem sexo não devam ser chamadas de galinhas, enquanto os caras são garanhões. Porém, não me parece nada inteligente passar elas a se chamarem de “pegadoras”. Em minha opinião de mulher, antes da jornalista ou mestra em artes cênicas, não é por aí que vamos resolver este assunto. Outro dia, ouvia Flavio Gikovate na tv falar justamente sobre o fato de não ser nada verdadeiro enfatizar as grandes vantagens do sexo casual, quando o melhor sexo acontece com alguém que a gente tem cumplicidade, algo, aliás, que não nasce da noite para o dia.
Outra coisa que também me deixa desconfortável é que ainda há uma reação de prazer, misturada a constrangimento quando são ditos “palavrões” no palco. Claro que entendo que esta é uma maneira de justamente criar uma identificação da peça com o seu público. Não me incomoda nenhum pouco que estes sejam ditos. O que me aborrece é que isso ainda faça a adolescência de hoje rir de um jeito exagerado. Mas o que importa é que é um espetáculo que traz à tona os assuntos que estão no dia-a-dia dos adolescentes. Não põe para baixo do tapete. Não finge que não existe. E, ao fazer isso, acaba fazendo muito. E, se me deixa triste saber que tudo que foi tabu na minha própria adolescência ainda segue em pauta, me deixa otimista ver que, os adolescentes agora não precisam ir para o escuro do seu quarto chorar e pensar em morrer. Eles podem ir para o teatro e ter a absoluta certeza de que não estão sozinhos. Nem ali, nem na vida. Alguém sabe o que se passa com eles, tanto que transformou em algo a ser assistido. E, neste aspecto, em comparação com a minha época, de déjà vu, sobra apenas o nome da companhia.
ROTEIRO: Textos de Vanja Ca Michel com pequenos fragmentos
          dos psicanalistas Cybelle Weinberg, Ruben Alves, do psiquiatra
          José Outeiral e dos escritores Carlos Drummond de Andrade e
          Moacyr Scliar.

          CONCEPÇÃO E DIREÇÃO: Vanja Ca Michel
          SUPERVISÃO: José Outeiral
        ELENCO:   Bibi Rositto
                           Débora Spadotto
                           Daniela Guerrieri
                           Diego Bittencourt
                           Gustavo Susin
                           João Carlos Castanha
                           José Ligabue
                           Lucas Ortiz
                           Manu Menezes
                           Mathias Martin
                           Thainá Gallo
                           Michel  Tinho
                           William Molina
        
          COREOGRAFIAS: Malu Kroeff e Michel  Tinho
          ILUMINAÇÃO: Moa Junior
          TRILHA SONORA PESQUISADA: Vanja Ca Michel
          MATERIAL GRÁFICO E SITE: Moa Junior              
          OPERAÇÃO DE SOM: Rogério Câmara                             
          PRODUÇÃO: Vanja Ca Michel e Moa Junior                    

          REALIZAÇÃO: Cia Déjà-vu



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