Celebração. Talvez essa seja
a melhor palavra para descrever a apresentação do Terpsi dentro da Programação
Dança.ponto.com. A ideia era fazer uma homenagem aos 25 anos desse grupo. Prima
de Angela Spiazzi, a única bailarina a permanecer desde o início, acompanhei
toda essa história na plateia e posso dizer que não há limites para a
criatividade dessa coreógrafa chamada Carlota Albuquerque. Assisti tudo arrepiada do início ao fim, emocionando-me com
a música, com o cenário e, é claro, com esses corpos que se doam a cada
movimento. A predominância do branco, os poucos elementos em cena, só
destacavam ainda mais os cheiros das especiarias que saiam da pequena mesa
próxima a minha cadeira. No palco, não há bailarinos, mas o pé de um, a cabeça
de outro, os braços de outro, tornando, ironicamente, impossível o
desmembramento desse coletivo de teatro-dança. Enquanto isso, eu segurava as
lágrimas que vinham da simples constatação do privilégio que era estar ali,
nessa cidade que luta para não ser esquecida no cenário nacional, vendo algo tão
único, criado por pessoas com tanto talento e que transformam emoção em
movimento. Reconheço características de outros trabalhos, enquanto observo que
nada é igual. Pouco importa que eu já tenha visto duas décadas e meia de
espetáculos, nada se repete. O Terpsi transpira o calor do corpo dos
bailarinos, exala a energia de sua coreógrafa e surge e ressurge chacoalhando
com os nossos sentidos. Assim, mesmo que uma chaleira esteja fervendo ali ao
meu lado, tenho a sensação de que estou sonhando pelo simples fato de ser difícil
acreditar que esteja diante de cenas tão poéticas, tão estéticas, tão
sensíveis. Mas, tendo visto tantas outras obras do grupo não deveria estranhar
que tudo é novo, fresco, como se nem tivesse sido ensaiado. Mas só quem não
conhece a persistência de Carlota para imaginar que tenha sido assim e, por
falar nisso, ela que sempre teve como referência Pina Baush, me faz lembrar Federico
Fellini. Não importa que os bailarinos brinquem com pratos, sovem massa de pão,
sirvam café ou caipirinha aos expectadores, eles me transportam a um universo
onírico, onde nada é impossível, onde a gravidade é desafiada em pequenos
passos ou grandes movimentos. E se tem algo que sempre me atraiu é que todos os
espetáculos me trazem a vontade de dançar, me dão a impressão de que qualquer
um poderia levantar e dançar também. Bem, mas terminado isso tudo, chegou a
hora dos depoimentos de quem fez parte dessa história e a choradeira geral,
inclusive minha, já que estavam falando de especiarias, me lembrou o filme
“Como água para chocolate” no qual a tristeza da cozinheira vai parar nos
pratos que ela prepara levando todo mundo as lágrimas. Pudera não. Eram
milhares de momentos extremamente especiais para serem recordados. De pessoas
que dançaram no grupo, de quem colaborou na criação e na estruturação do Terpsi
ou até mesmo para quem sempre o fotografou e da própria Carlota que declarou
que ela não era só ela, mas a soma de todos aqueles que só tinham palavras de
agradecimento. Intensidade. Foi a que usaram para descrevê-la e que, sem
dúvida, também serve para falar do seu trabalho e dessa noite. Como ela mesma
falou, mais uma vez ela disse estar fazendo seu último espetáculo. Mas quem a
conhece sabe que essa afirmação só dura até ela começar a criar o próximo. Ainda
bem porque, mesmo tendo visto tantos, a gente nunca se cansa de rever o Terpsi
que se recria a cada espetáculo, a cada passo dessa dança-teatro que é
simplesmente fascinante. Ah, prima, e tu podes aparecer aqui em casa para sovar
um pão de vez em quando.