Saturday, October 06, 2012

Meus pais nunca me disseram: “eu te amo”


Como todo mundo que se interessa por psicologia, psicanálise, psicoterapia, acabei analisando as atitudes dos meus pais na busca de explicações para coisas que aconteceram comigo. Passei anos (que pareciam infindáveis) com problemas de autoestima. Embora já tenha ouvido pelos parentes que, desde pequena, era extrovertida, falante, engraçada, minha adolescência me levou, como geralmente leva, a crises profundas, revoltas, vontades que iam, desde sair de casa a morrer, desaparecer da face da terra.
Sim, eu me lembro de me sentir sozinha antes disso. Por alguma razão, eu estudava em períodos diferentes das minhas duas irmãs e do meu irmãos e ficava com as auxiliares em casa enquanto os demais iam com os meus pais professores para a escola. Houve outras circunstâncias semelhantes. Depois o sentimento de solidão tinha mais a ver com o fato de não ser compreendida. Eu me sentia frágil, carente, quase todo o tempo. Meus pais haviam sido criados por pais determinados, batalhadores, de boa índole, amantes da ética e dos bons costumes. Associado a isso, vinha uma ideia de que se estivéssemos limpos, saudáveis, alimentados era suficiente. Não para mim. Eu queria mais. Só não sabia exatamente o que, nem como. Mas achei que precisava buscar fora da família.
Talvez, por isso, já aos dez anos tenha me apaixonado por um colega de classe. É claro que era platônico. Não, nunca me declarei. Acho até que ele nem sabia. E aos 13 engatei em um namoro com outro. Foi quando disse “eu te amo” para alguém pela primeira vez. Ah, e ouvi também. Mas era tudo muito conturbado. Eu não me amava como alguém poderia me amar? E o que eu devia fazer para sentir esse amor, acreditar nele? Isso gerou muitos conflitos, a partir dos 18, quando não bastava ser bom moço para me interessar e outros começaram a me querer também.
Nos últimos dias, me peguei, pensando que, só recentemente, tenho ouvido, com mais frequência: “eu te amo”, dito pelos amigos. E eu acabo duvidando, achando exagerado e não raro vem àquela vozinha: “me ama porque não me conhece direito...”. Em seguida, percebo que isso é falta de prática em ouvir essas palavras. Não posso dizer que faz muitos anos que não digo. Vez por outra, faço uma força e deixo as palavras saírem, sempre pensando que se ficar evitando, um dia, poderá ser tarde demais. Não é fácil. Afinal, demorei muito tempo para valorizar o amor que recebi dos meus pais mesmo sem eles saberem como expressar isso e acredito que, numa atitude defensiva, passei a dar muito valor aos gestos, ao comportamento e menos a essas palavras. Outro dia, pensava nisso enquanto segurava o meu cachorro doente dentro do banheiro em uma tentativa de “nebulização” para ajudá-lo a sair da crise respiratória em que estava. Se não fico dizendo que amo pessoas, nunca digo que amo meus bichos, mas sempre me esforcei para mantê-los limpos, alimentados e saudáveis. Será que basta? Bem, me acostumei a achar que sim, mas se fosse totalmente verdade, por que me vem uma tristeza, uma melancolia quando algo me traz à memória meu passado, uma época em que eu, não só amava, como amava demais. Era bem sofrido. Então, por que essa saudade? Acho que é da esperança de encontrar alguém para me dizer: “eu te amo”. 
Daqui a alguns dias, faço 50 anos. Já está mais do que na hora de voltar a dizer “eu te amo” novamente.