Fui ver Eros Impuro porque
conhecia o diretor. Quer dizer... virtualmente. Encontrei o jornalista e dramaturgo Sergio
Maggio pela internet quando fazia minha pesquisa de mestrado sobre crítica
teatral. A partir de então, eu e o morador de Brasília, mantemos contato on line e foi assim que soube que ele
estaria em Porto Alegre. Como sempre,
fiz questão de não ler nada sobre o espetáculo.
E, embora muita gente ache isso estranho, eu fico ainda mais admirada
dessa necessidade de precisar de explicações sobre a arte. Para mim, comentários e críticas,
exatamente como esse, são válidos para aprofundar impressões, usufruir outro olhar, mas gosto de ser surpreendida e é assim que
descubro que a peça se trata de um monólogo do ator Jones de Abreu. É preciso
dizer, porém, que ele trava intensos diálogos com outros personagens das
histórias que ele narra. E a intensidade com que faz isso é presente desde o
primeiro momento, quando ele passa a desenhar um rosto enquanto encara alguém
na plateia. O fato de ele estar em um ateliê já torna tudo mais curioso.
Afinal, quem me conhece sabe que gosto dessa mistura das artes cênicas com as
artes plásticas. Quanto ao tema, não fica muito claro, para mim, logo de
início. O ator nos leva aos poucos para sua vivência com os modelos que pousam
para ele e provocam suas reflexões. Ao falar de sexo, prazer e culpa, ele vai
provocando em mim um sentimento de desconforto que me faz lembrar meu professor
e cineasta Sergio Silva que sempre me advertia que o filme que ele iria passar
continha cenas picantes e que iriam perturbar minha sensibilidade originária de
uma educação rígida. E esse sentimento vai me acompanhar até o final, dividido
com a percepção da força da atuação desse único homem no palco que é capaz de
se dividir em outros personagens, discutir com seres “invisíveis”, alternando momentos
de fragilidade, raiva, lucidez e loucura.
Eu poderia falar dos vídeos, da sua contracenação com uma projeção, da
luz ou da trilha, mas são suas palavras que criam imagens provocantes numa
mistura de pornografia e poesia... ”escorregava as mãos por entre seus desejos”.
Essa oscilação entre um mundo pervertido de crime e castigo vai se
intensificando, fruto do entendimento do abuso, do desrespeito, das memórias de
uma infância corrompida. Ao sair,
suspiro e tomo consciência de que o espetáculo não tem a intenção de chocar
pura e simplesmente. Ele é, antes de tudo, uma denúncia que está no próprio
texto do ator que diz: “a minha arte é o meu punhal”.