Thursday, April 25, 2013

Caetano : um amor de ontem?



Eu devia ter desconfiado quando, depois de comprar o último CD do Caetano só consegui ouvir uma vez.  Mas, depois de tantos anos, ficava difícil acreditar que eu não tinha gostado de suas músicas. Assim, decidi ir ao show. Araújo Viana lotado. Pessoas de todas as idades. Porém, já estava na metade do show e eu , sentada, perguntando a mim mesma: será que o nosso amor acabou?
Depois de me conscientizar de que devia ser proibido, proibir e me encher de vontade de sair por aí sem lenço e sem documento, será que um dos meus ídolos da adolescência havia seguido o seu caminho sozinho? Escondido segredos embaixo dos caracóis dos seus cabelos? Ele, que me apresentou a um estado de transcendência cantando Um índio, que acariciou meu coração com a suavidade de sua voz com Kalu? Que cantou em inglês, espanhol e até em francês? Que reforçou minha autoestima toda vez que cantava Você é linda? Que me deu uma das melhores lembranças da minha vida ao ver um dos caras mais interessantes da turma cantar Leãozinho prá mim no meu aniversário? Que idade eu tinha, mesmo? Não lembro. Em algum ano da década de 80. O mesmo que traduziu tantas emoções que a paixão pode provocar cantando Tantas Palavras... Que me estonteava com demonstrações da riqueza da nossa língua. Não, eu não conseguia acreditar que todas aquelas músicas que embalaram por anos tardes, noites manhãs faziam parte do passado. Então, pensei que, talvez, fosse a distância e fiz questão de me aproximar e, por alguns minutos, enquanto eu via o seu rosto e o seu sorriso, eu voltei a reconhecê-lo. Mas, durou pouco. Logo em seguida, vieram àquelas músicas, cujas letras já não parecem apresentar a mesma poesia, que tem um tom amargo, um arranjo de notas por vezes arrastado e eu só pensava: não enche. Porém, quando eu já estava quase desistindo, chegando até a olhar o relógio, veio uma melodia do passado e outra e outra. E a plateia, que até então, estava praticamente inerte começou a reagir e eu até dancei na cadeira enquanto ele cantava “de noite na cama eu fico pensando...”. Eu também pensei. Pensei que não podia jogar fora uma história tão antiga, uma história que provoca tantas lembranças incríveis, que me reportam a uma época em que eu descobria o amor, a mim mesma. E, assim, me dei conta, Caetano, que não, eu não te odeio. É apenas uma crise. Afinal, eu ainda desejei ter sido uma das pessoas que tocou a tua mão e ainda quero que seja prá mim que tu cantas “e quero que você venha comigo”. Então, eu peço desculpas se, nesse momento, não estamos tão sintonizados. Aconteceu algo assim com Circuladô e Tropicália e, hoje, isso está superado. Assim, volto prá casa, sentindo que depois de mais de 30 anos, a paixão, talvez, tenha acabado, mas o amor, esse não se despreza. 

Thursday, April 18, 2013

As perdas e as recompensas


Tive vários bichos ao longo da vida. Muitos gatos, alguns cachorros e meu irmão gostava de ter tartarugas quando ainda morávamos em um apartamento. Lembro, ainda que vagamente, que algumas acabavam morrendo de uma maneira meio besta. Uma porta que se abria enquanto a dita estava em baixo ou coisa parecida. Porém, eu não era apegada a elas.
Depois quando fomos para uma casa, a história com os gatos foi diferente. Eles apareciam no pátio e a gente começava a cuidar, dava comida e quando batizava, pronto! Era nosso. Ainda mais quando escolhíamos nomes como: Epaminondas da Silva Silvério. No entanto, muitas vezes, meus pais nos fizeram levar os gatos para a Dona Palmira (uma dessas casas que acolhiam os bichos). Lembro que era uma choradeira. Minha mãe fazia longos discursos, dizendo que eles iriam ficar mais bem cuidados, etc. A gente esperneava, mas, não havia jeito. Lembro, particularmente, de um gato cinza que eu e minha irmã achamos na rua, enquanto andávamos de bicicleta, que mais parecia um rato. Mas a gente resolveu que levaria para casa e o gato acabou crescendo e foi ficando lindo, com alguma mistura de Angorá. Irreconhecível. Depois, tivemos um cachorro. Não lembro como ele foi parar lá em casa. Já que minha mãe e meu pai nunca foram muito interessados em animais. Todos eram apaixonados pelo Toby, que latia bastante, fazia um furdunço na vizinhança. Acabou sendo envenenado, provocando uma choradeira na família por vários dias. Era meio ridículo até. A gente ficava bem, conversava sobre, dali a pouco, nos olhávamos e voltávamos a chorar.
Passamos muitos anos sem querer ter um cachorro de novo. Depois, quando eu já tinha meu próprio dinheiro, resolvi que meu sobrinho que morava conosco deveria ter um cachorro e comprei um Cocker, cor de mel, meigo que só vendo. Mas ele adoeceu e eu tive que correr para o veterinário que disse que era Sinomose, que não tinha volta e seria melhor eu me despedir do cachorro ali mesmo.  Chorei horrores, mas ouvi a voz do profissional e tive que dar a notícia. Foi um drama. Afinal, um dia o cachorro estava ali. No outro, não mais.  Assim, essa tentativa nos afastou da ideia de ter bichos de novo por muitos anos. Até que esse mesmo sobrinho acabou trazendo para a casa uma cadela, batizando-a de um nome francês, provavelmente para amolecer o coração da minha mãe e, mais tarde, um gato que, durante um bom tempo, ficou escondido no quarto dele, pois ele sabia que havia uma resistência a novos bichanos. Afinal, todos sabemos, eles exigem cuidados.
Anos depois, quando meu sobrinho se mudou, começou levando os bichos com ele: a Charlotte e o Bernard, um gato branco lindo. Senti a ausência dos dois, mas sabia que estavam sendo bem tratados e podia visitá-los sempre que quisesse. Quis a vida, porém, que eles acabassem voltando, assim como meu sobrinho, para casa. Isso fez com que minha mãe, vendo que havia certa negligência de nossa parte, incluísse em suas tarefas diárias dar comida e água para os animais. Para mim, sobrava a parte de dar banho e levá-los ao veterinário eventualmente. Muito pouco para o benefício de ter uma cadela que festeja todas as entradas que eu fazia na casa. Não havia uma única vez que ela não me recebesse com a maior demonstração de alegria. Eu, que achava que só gostava de cachorros pequenos e peludos, não tinha como não me apaixonar pela forte personalidade da Charlotte que parecia encantar a todos. E, foi assim, que o Dick entrava em nossas vidas. Primeiro, apenas fazendo companhia para a cadela em suas corridas lomba acima e lomba abaixo, usufruindo da liberdade fora do portão. Depois, fazendo plantão na frente da casa todos os dias, inclusive quando chovia. Dia de festa, não raro, ele acabava entrando com algum convidado, tentando se misturar.  Mas foi um atropelamento que abriu as portas definitivamente para a sua nova morada. Ao vê-lo machucado, minha mãe tentou localizar o dono e descobriu que ele não tinha ninguém que assumisse verdadeiramente esse papel. Ele recebia comida? Sim. Tinha o que beber? Também. Mas, só. E, assim, sem entrar nos pormenores de toda uma saga do que era para ser uma guarda compartilhada, assumimos definitivamente o Dick. Em troca, ele fazia questão absoluta de demonstrar toda a sua alegria de não ser mais um “homeless” como nós costumávamos dizer nas muitas vezes em que ele dava as suas escapadas para fazer uma ronda na rua que havia sido seu habitat por tantos anos. Mas, não se enganem, não havia dúvidas sobre a sua felicidade em ser chamado de volta, pois ele agora tinha a possibilidade de viver nesses dois mundos em que os vizinhos passavam para dar olá e nós “conversávamos” com ele cada vez que ele nos recebia.
Dick latia para tudo e para todos. Isso fez minha irmã apelidá-lo de “guardião”. Logo que o adotamos não era fácil dormir com seus latidos ininterruptos. Muitas vezes, tive que abrir a janela para mandá-lo calar a boca. Bem, mas, aqui estou escrevendo detalhes de coisas que qualquer pessoa que tem um animal já sabe: um animal exige cuidados, mas nos dá muito mais em troca. Entre tantos momentos em que me senti querida pela manifestação de alegria do Dick, ficou ainda a compreensão de que existem muitas formas de afeto e, foi cuidando dele quando a idade começou a provocar problemas mais sérios de saúde, acordando só para ver como ele estava, alternando coisas que poderiam deixá-lo mais confortável, que eu, finalmente, compreendi o jeito de me amar dos meus pais.
Não faz muito tempo, nós já preocupados com as condições que a idade trazia para o Dick, o vimos ser agredido por um cão da rua, que o abocanhava e o largava. Eu, entendendo que ele não teria condições de resistir, sem saber o que fazer, corri em direção ao cão aos gritos e consegui salvá-lo. Ele levou pontos. Exigiu cuidados especiais, mas voltou a latir como sempre e a dar suas escapadas sempre que podia. Voltando sempre com a mesma satisfação com que saía. Por isso, foi preocupante, vê-lo nesses últimos dias tão abatido. Já não tendo o ímpeto de explorar o lado de fora, buscando ficar próximo de mim quase todo o tempo. Só que já não era tão simples escolher como tratar essa insuficiência respiratória que agonia quem está em volta e deve ser terrível para quem a sofre. Fiquei tentando evitar deixá-lo nas clínicas, pois, achava que o melhor era ele estar entre as coisas e pessoas que conhecia. E, muitas vezes, quando ele estava em silêncio, achavámos que já tinha chegado a sua hora. Mas, ainda na noite passada, quando, finalmente, a falta de ar deu uma trégua e ele dormiu pensei que tinha sido seu último suspiro. Aproximei a mão e ele levantou a orelha, como se dissesse: não, ainda não.
Então, hoje, dia em que o Dick, definitivamente, se foi, acabei derramando muitas lágrimas. Tendo uma reação maior do que eu imaginava já que enfrentei da melhor maneira possível a perda do meu irmão, do meu pai, da minha tia, de amigos.  Provavelmente, fazendo uma espécie de catarse de todas essas ausências, talvez lastimando o vazio que a partida do Dick deixa no pátio e em nossas vidas. Mas, hoje, eu vou, tentar, finalmente, dormir direito, pois sei que ele se sentia acolhido, que era grato pelo carinho que recebeu. Tomara que eu consiga honrar o guerreiro que suportou tanta dificuldade respiratória, a pouca audição, a pouca visão, e outras coisas que eu jamais vou saber, só para me dar o prazer de tê-lo por perto.  E, para quem acha que é melhor se poupar do trabalho que um bicho dá ou prefere evitar as emoções que a perda pode provocar, saiba que eu não tenho nenhuma dúvida: se eu pudesse voltar atrás faria tudo de novo, pois receber o afeto de um bicho mais do que compensa, recompensa.

Wednesday, April 10, 2013

Anna Karenina: Uma nova linguagem cinematográfica para um clássico da literatura



Bem feito para mim. Não gosto de ler nada antes de ver um filme. Nenhum comentário, sinopse. Crítica, muito menos. Mas, ouço rumores e foi assim que fui parar no cinema para assistir Anna Karenina. Embora esse nome tenha estado presente durante grande parte da minha vida como uma personagem do livro de Tostoi, nada sabia sobre ela.  O livro está por aqui em uma das prateleiras, mas é só. Sendo assim, os primeiros minutos do filme foram de puro estranhamento. Eu adoro cinema. Tenho o mesmo sentimento pelo teatro, mas quando essas duas coisas se misturam não é assim tão fácil de absorver. Woody Allen gosta de fazer isso, mas enquanto o assunto é comédia, minha aceitação é mais tranquila, sem resistência, o que não é o caso.
Se partirmos do princípio que para ser teatro é preciso corpo presente, troca entre atores e plateia, não é disso que eu estou falando. Mas então porque a gente vê como teatrais movimentos que não correspondem aos fatos? Portas que se abrem levando para lugares improváveis, gestos, movimentos totalmente fora do cotidiano. Também não dá para ignorar que muitas cenas são feitas no ambiente de um edifício teatral, com abertura de cortinas e tudo mais. Junta-se a isso uma fotografia de contrastes entre cores, uma luz que dá foco artificial em algum objeto ou personagem, contextualizando a cena e eu reconheço elementos cênicos ali. Daqueles que transformam uma cena de capinar, de trabalho braçal uma das imagens mais poéticas que já vi.
Porém, não se iludam. Eu estava dizendo que fiquei achando tudo muito estranho no início. E aqui essa palavra é sinônimo de incomodo, contrariedade, quase desgosto, não o contrário. E vai assim até que, sabendo que ainda teria um bom tempo de filme, decido relaxar. Ah, a proposta é essa. Então, vejamos o que posso aproveitar dela. E é a partir daí que eu saio daquele momento de me remexer nas cadeiras para começar a pensar: nossa... isso foi ousado, intenso, Aaron Taylor-Johnson nos convence de que não é nada difícil perder a cabeça por ele e mostra que, apesar de ter apenas 22 anos, “o garoto de Liverpool” já está preparado para atuações mais audaciosas. Nem vou entrar no mérito do resto do elenco, mas tem muita gente boa aí envolvida.
genial. O figurino por si só já encantaria. E ainda por cima com bailes! Minhas amigas da dança se divertiriam com os passos dos personagens. Bem, e por falar neles, Judy Law que costuma fazer um enorme sucesso em suas comédias românticas é, definitivamente, outra pessoa nesse filme. E, devo confessar, que todo rosto bonito que faz um papel em que já não fica tão bonito assim, sempre ganha o meu respeito. Keira Knightley que já havia me conquistado em Orgulho e Preconceito segue me impressionando pelo menos nesse papel de mulher apaixonada e sofredora.
O diretor Joe Wrigth deve ter tido um trabalho imenso em orquestrar cada cena. E a palavra é essa mesma, pois a gente percebe que é tudo milimetricamente previsto. Não falta nada. Nada excede. Acabo saindo do cinema com a opinião transformada sobre essa “linguagem” que o filme resolveu criar e eu já deveria saber que, não é porque é imagem que é mais importante ou mais verdadeiro do que a impressão que nós sentimos. Então, o meu conselho é: esqueça aquilo que você acha que sabia e esteja aberto para o encontro inusitado entre o teatro e o cinema e divirta-se com os caminhos da arte no século XXI.

Monday, April 01, 2013

Natalício Cavalo: a vida em forma de espetáculo


Até ver Natalício Cavalo eu achava que “peça” e “espetáculo” eram sinônimos. Não acho mais. Quando uma peça é capaz de nos envolver nos primeiros minutos, apresenta atores com um mesmo nível (alto) de interpretação que cantam, dançam, trocam de papéis, estamos falando de um espetáculo. Mas, para ser sincera preciso dizer que sempre que vejo Heinz Limaverde no palco ele me conquista. Então, assim que ele se dirige ao público e começa a dizer o que vamos ver e fala do jeito mais tranquilo e doce que o protagonista vai morrer, eu já fico impressionada. Depois, quando todas as luzes se apagam, eu seguro a folha que me entregaram na entrada, tentando lembrar o que fiz naquela tarde, nas últimas semanas, vou sendo conduzida por eles a uma “regressão” da minha própria existência. Uma coisa é certa: eu não estava preparada para a beleza dessa história contada pela Cia Rústica e dirigida por Patrícia Fagundes.
Já havia escutado comentários de que o espetáculo falava da morte. Não para mim. Nem para eles. Como consta no programa: é uma comemoração à vida. A partir de alguém que, eles mesmos dizem, não é famoso, nem teve uma vida perfeita ou fez coisas extraordinárias. Ao contrário, é sobre as experiências de um ser humano qualquer  que se questionou várias vezes sobre sua existência, que “desperdiçou” tempo se envolvendo com várias mulheres, gerando várias outras vidas. Que, se não era um mau caráter, jogava, bebia, perdia mais do que ganhava dinheiro. Então, o que tem de especial? O que me fez ir às lágrimas?  Talvez porque eu tenha ido ver a peça na mesma semana em que vi duas borboletas e me perguntei se elas teriam noção de que em pouco tempo  estariam mortas, mas que ainda bem que elas estavam ali para embelezar o mundo. Ou porque tenha sido no momento em que a Xuxa fez a mesma idade que eu e nos 50 anos dela tornou-se conhecida em todo o país, construiu uma fundação, ajudou milhares de pessoas, enquanto eu... Ou então, porque meu pai, que se expressava tão pouco, ouvia música gaudéria o dia todo. Ou ainda porque meu irmão tenha vindo almoçar aqui em um Domingo e partido para sempre naquele mesmo dia depois de um mal-estar. Talvez também porque, quando eu tinha 30 anos, recebi um diagnóstico de uma doença rara e incurável que me colocava em risco de derrame cerebral e ataque cardíaco.  Quer dizer, é sobre isso que a peça trata. Sobre a vida, sobre a morte. Sobre os sonhos, sobre as perdas. Sobre o fato de sermos todos sobreviventes.
É forte a presença dos elementos da cultura gaúcha, a minha cultura. Cavalos, botas, chapéus... Assim como a presença das mulheres que não são colocadas aqui em segundo plano. Ao contrário. Destacam-se pela beleza dos gestos, personalidade, sensibilidade. E assim, palavras, misturadas a um figurino impecável de Daniel Lion, imagens de fotos, jornais, cartas, vários elementos jornalísticos, tudo isso me faz gostar ainda mais e sair dali procurando confirmações de que Natalício Cavalo de fato existiu (ou não). Mas não é preciso ser dessa área para achar impressionantes esses registros, aparecendo assim, em grandes telas que também fazem um jogo de sombras do próprio ator no palco, ora preenchendo a foto, ora  servindo de fundo para o personagem. De qualquer forma, poético. Enquanto, no palco, os atores,  Heinz Limaverde, Lisandro Belloto, Marcelo Mertins, Marina Mendo, Priscilla Colombi, Rossendo Rodrigues, dão vida às palavras escritas. Há uma cronologia, mas também há cortes. Há um roteiro cheirando a fantasia, entremeado de citações, de datas. Há a explicação técnica do que se trata uma gineteada. Há um tom dramático. Há partes que provocam o riso. Mas mais do que tudo, há os corpos dos atores fazendo movimentos integrados, deslocando partes do cenário de Rodrigo Shalako, nos levando a filosofar sobre o tempo, o envelhecimento. 
Tudo vai acontecendo de um jeito sincronizado com um ritmo que vai na contramão do tema pesado que, a princípio,  está sendo tratado. E não dá para ignorar, trilha sonora de Arthur de Faria, introjetada com naturalidade, costurando os atos que nos perturbam pela sua simplicidade. Afinal, sabemos que eles estão se referindo a Natalício Cavalo, esse “marginal do sucesso”, mas podia ser meu pai, meu tio, eu mesma. Ah, e quase ia esquecendo a figura da morte. Essa que aparece em tantas cenas, com máscaras, de um jeito quase divertido e que negocia com os atores em cena, mostrando que ela não tem pressa, pois, afinal, todos sabemos, é só uma questão de tempo. Aliás, por falar nisso, sabendo que “uma vida não cabe no tempo de uma peça”, vários eventos da existência de Natalício Cavalo são citados um atrás do outro e nos levam para uma forma simbólica de vivenciar sua morte. E seria triste, se ele mesmo não aparecesse falando sobre o que houve, sem a angústia de toda a sua vida, mas querendo deixar algo mais que não permita esquecê-lo. Mas já não era mais necessário. A Cia Rústica me fez crer que Natalício Cavalo de fato existira e sendo um personagem que relembra toda e qualquer pessoa, tanto ele como o espetáculo são inesquecíveis.