Tuesday, February 13, 2007

Sobre crimes e criminosos

Sei que várias pessoas que já foram atingidas por algum tipo de violência podem não concordar comigo. Mas, não compreendo este tipo de manifestação que se indigna com a barbárie e fica com o ímpeto de apedrejar os bandidos. A incoerência é muita para que eu consiga entender. Reconheço que existem atitudes que fogem ao que podemos suportar, mas, será que as pessoas não se dão conta de que não bastará intensificar leis, punir os bandidos, mudar todas as regras, se não houver um envolvimento social real? O pior bandido, o mais cruel assassino nasceu um dia uma criança inocente, sem intenções de cometer nenhum gesto de violência. Tudo bem. Alguns vão dizer que a ciência está tentando investigar a índole criminosa de alguns, o mau funcionamento do cérebro, neurônios de outros, componentes que criam uma propensão para estas atitudes, mas, não passa disso, uma tendência.

Eu acredito profundamente que é o meio, as dificuldades, a falta de perspectiva, o mau exemplo dos poderosos, a diferença social absurda que leva a atos insanos, a revolta ou até mesmo a um tiro dado na hora de roubar um tênis. Já fui assaltada. Sei que dá raiva. O sentimento de impotência é irritante, para dizer o mínimo. Poderia ter sido ferida, morta, etc, justamente porque não consegui ver nos indivíduos que me atacaram seres tão diferentes de mim. Sei que isto é ingênuo e pode ser perigoso, mas, também, não posso concordar com estas pessoas que, simplesmente, esquecem a sua responsabilidade diante disso tudo. Será que esta mesma pessoa que se considera tão boa, tão generosa, tão incapaz de qualquer ato de violência continuaria assim se passasse fome, se não tivesse nenhuma perspectiva de futuro, se ao seu redor só visse desesperança e injustiça? Duvido.

Com a morte deste menino João, fala-se muito em não deixar que ele seja mais uma estatística, mas, será que não percebem que dirigir a ira àqueles que praticaram o crime também não resolverá a situação em que vivemos? Não quero dizer que eu tenha a resposta. Não tenho. Tenho idéias, discuto possíveis soluções com várias pessoas, como a maioria faz. Acredito no controle da natalidade, na educação, em dignidade política e em consciência social. Se eu, que sempre tive uma boa qualidade de vida, me perturbo, me desmotivo, me indigno com a falta de oportunidade, de igualdade, de distribuição de riqueza, por que estas pessoas que, praticamente, não têm nada a perder vão se preocupar com o que acontecerá depois?

Acredito que existem desgraças, atos criminosos como este que ocorrem para que todos prestem mais atenção, percebam que precisam se envolver com o que acontece a sua volta antes que seja tarde. Mas, não fazendo discursos, julgamentos sobre os que cometeram os crimes. Acho isso triste. Não acredito que isso resolva absolutamente nada. As pessoas dirigem suas iras aquela pessoa ou aquele pequeno grupo. Prendem, torcem para que morram e de que adianta? Para que outras pessoas, outra desgraça, outro crime hediondo ocorra, é só uma questão de tempo. Porque não preciso de bola de cristal para saber que, se não são alteradas as razões para que existam criminosos desta estirpe, eles continuarão a existir e não adiantará as pessoas ficarem apenas gritando como a Rainha de Alice no País das Maravilhas: "Cortem as cabeças!"

Sunday, February 11, 2007

O Tempo

Envelhecer. Está aí um assunto que me provoca, mas, devo confessar que sobre a idade me expresso diferente da maioria das pessoas. Encho a boca para dizer quantos anos tenho. Não que isso faça realmente diferença, mas, é que acho engraçado as pessoas omitirem esta informação, principalmente, ainda, as mulheres.
A razão para este meu pensamento é algo que o Mario Quintana também já havia falado. Quando estava fazendo 30 anos, descobri que tinha uma doença rara chamada policitemia vera que é o aumento dos glóbulos vermelhos no sangue e, ao ouvir o Dr. Faillace, conhecido como o papa da hematologia, dizer que os riscos eram de ataque cardíaco e derrame cerebral pensei: "vou morrer'. Lá se vão mais de 15 anos. Troquei de médico. Mas, a proximidade da idéia da morte (que sabemos vai acontecer um dia) me fez querer a alternativa, ou seja, ficar uma velhinha bem enrrugada! Nunca mais tive medo de envelhecer. É claro que não quero ficar inativa, cheia de dores, etc, mas, como não tenho grandes restrições mesmo com este problema, a não ser não poder comer carne vermelha e outros alimentos com ferro. No mais não há nada proibido, não acharia ruim viver longos anos. Sim, porque várias pessoas dizem que não se importam de envelhecer desde que tenha saúde e uma cabeça boa. Eu, já não posso dizer que tenha saúde e quanto a cabeça boa...

Agora, pelo fato de não ter me casado, nem tido filhos, acaba ainda mais forte a impressão de que o tempo fica devorando as horas. Acredito que ver os filhos crescerem deve dar uma idéia mais exata do que está acontecendo conosco. Caso contrário, a gente olha algumas rugas no espelho, mas, ainda sente por dentro várias das angústias de menina, ainda segue com os mesmos planos e desejos. Talvez, por isso, conviva hoje com gente bem mais jovem do que eu. Meus amigos, minhas melhores amigas, todas não tem mais de 30 anos. Seguir na faculdade mantém uma energia, uma vontade de aprender que eu tinha nos meus 20 anos (quando eu adorava cantarolar a música do Fábio Junior no violão, que voltei a tocar o ano passado).

No entanto, não me importo de ir trocando a juventude, por uma aceitação e compreensão melhor de mim mesma. Só não me vejo podendo cantar "Non, je ne regrette rien". Eu me arrependo, de vez em quando, de algumas coisas. Às vezes até de coisas que fiz no dia anterior. Só que hoje acho que fiz o melhor que podia na época em que tudo parecia sempre tão confuso, tão decisivo. Lembro de uma vez (acho que tinha uns 25 a 27 anos) em que fui pedida em casamento. Isto nunca tinha me acontecido antes. E eu só chorava. Não era de alegria. É que eu gostava do cara em questão, mas, não estava apaixonada e a idéia de me casar só porque outras pessoas já estavam casadas, ou porque já estava na idade, me apavorava. Disse não. Ninguém nunca mais me pediu, mas, tá aí, uma coisa da qual não me arrependo.

Quando fiz 40, marquei uma festa no Café dos Cataventos lá na Casa de Cultura do Mário Quintana, uma das poucas pessoas que são meus ídolos, e pedi a todos que decorassem algo para dizer no dia. Meu irmão, escolheu justamente uma das poesias dele sobre o tempo ("a vida é uns deveres que nós trouxemos para fazer em casa. Quando se vê, já são 6 horas..."). Ele nunca queria dizer a idade. Irritava-se quando perguntavam. Se a gente falava a idade que tinha e dizia que ele era o mais velho ficava bravo. Não queria envelhecer. Acabou morrendo aos 49 anos com uma cara de menino e um sorriso maroto que fazia quando dizíamos que estávamos envelhecendo em volta dele, enquanto ele continuava com aquele ar de adolescente. Não vou vê-lo ficar enrrugado, nem com dificuldade de andar ou coisa parecida. Ele conseguiu o que queria, mas, eu, certamente gostaria de continuar tendo meu irmão mais velho por perto! Em minha memória, ainda o vejo de macacão Lee e pés descalços, cantarolando músicas dos Beatles, sua grande paixão. E assim como esta, ainda tenho viva em minhas lembranças muitas coisas do passado, do qual tu fazes parte, e compreendo perfeitamente o Mario Quintana quando ele diz: "Sou um pobre menino... acreditai!...Que envelheceu, um dia, de repente!..."