Friday, April 29, 2011

Cena do balcão no século XXI

Além do fato de serem do mesmo país do maior autor de teatro de todos os tempos, o príncipe William e a agora princesa Kate pouco tem em comum. Entretanto, ao ouvir falar na expectativa do povo em ver a cena do balcão, Shakespeare me veio rapidamente a memória.

Depois de muito blábláblá na imprensa, divulgação de várias informações e especulações sobre o casamento, chegou o famoso dia. Perdi a entrada dos convidados mas assim mesmo pude ver um desfile de chapéus e alegorias na cabeça da maioria das mulheres. As filhas do príncipe Andrew erraram feio e perderam uma ótima chance de estarem elegantes. Pareciam mais as malévolas do filme Cinderela do Walt Disney.

Kate Midleton apareceu com um vestido aparentemente simples mas com bordados a mão, a tiara da realeza e numa elegância só. William não estava mentindo quando disse que ela estava linda, embora eu tenha convicção que ela podia estar enrolada em um saco de batatas que ele diria a mesma coisa.

Os convidados foram levados para a abadia em algo que eles faziam questão de chamar de “carruagens motorizadas” mas que não me pareceram nada diferentes da lotação que passa aqui na esquina, a não ser pela cor. Por falar em cor, a rainha acertou em cheio com aquela roupa amarela. Conseguiu se destacar e ainda manter a classe. Chamando a atenção como sempre pelo seu chapéu e bolsa e mantendo o maior enigma da face da terra: o que ela leva dentro da mesma e provocando a velha piadinha que são as chaves da casa.

Willian não tinha como errar naquele uniforme, porém, a longa cabeleira de sua futura esposa fez destacar ainda mais a falta de cabelos do príncipe. Entretanto, este “defeito” não chega a tirar o carisma, que dizem, ele herdou da mãe (do pai eu sei que não foi). Além disso, aqueles olhos azuis, com certeza, vão fazer com que as mulheres que já tinham a mania de ficar esperando seu príncipe achar que agora valerá mesmo a pena. Até porque aquela que encontrar não será obrigada a ficar ouvindo três horas de sinos tocando, o que mal posso acreditar que tenha de fato acontecido. Mas se considerarmos que perguntaram duas vezes se havia alguém que tinha algo contra o matrimônio e que ninguém se manifestou é provável que haja mesmo razão para tanto barulho. E, pensando bem, a Kate não deve ter se importado com isso depois de ouvir Willian dizer que o que era dele ele compartilhava com ela. Frase que por pouco não cai em descrédito depois que a aliança deu uma trancada nas juntas do dedo de Kate antes de, finalmente, entrar.

A Abadia de Westminster estava interessante com as árvores que Kate colocou lá dentro para a cerimônia. Estas davam uma certa leveza a austeridade do momento. Quem também contribuiu para momentos menos formais foi Richard Carau, o bispo que em seu discurso fez questão de dizer que “todos os casamentos são reais” e que “olhamos para um século que tem muitas promessas e muitos paradoxos” e que o “amor deve ser seguro e não opressivo”. Disse também que hoje era um dia de alegria e de esperança. Embora nem tanto para os 2/3 que não foram convidados para a festa. Ainda assim, para comemorar este casamento que não foi arranjado pela família real ainda seria feito um buffet para 600 pessoas. Isso sem falar nas champagnes que eles já começaram a tomar logo após a cerimônia. Eu devia era ter comprado uma para comemorar o momento. Mesmo que não fosse uma Pol Roger. Afinal, concordo plenamente com Churchill que dizia que ao ganhar ele merecia uma e que ao perder precisava dela.

Imagino uma festa grande e cansativa. Porém, como o casal pediu dois anos de moratória para só depois começar com as obrigações reais creio que eles terão bastante tempo para descansar. Isso, espero, depois de trocarem uns beijos bem mais intensos do que os que acabaram trocando na sacada porque tenho certeza de que se Romeu tivesse subido o balcão, com certeza, não teria dado apenas um “selinho” na Julieta.

Friday, April 22, 2011

Chega de Páscoa Sofrida

Marcelo Carneiro da Cunha

De São Paulo


Estimados leitores, essa coluna inicia aqui o movimento internacional e global pelo fim da Páscoa. O que não significa o final do feriado, de maneira alguma. Todo mundo vai poder continuar ficando preso em engarrafamento livremente, não se preocupem.

Mas, o que eu acho que seria uma excelente ideia é apenas remover do nosso calendário emocional uma data baseada no pior do catolicismo: a ideia de compartilhar do sofrimento de algo ou alguém que estava lá de propósito e para isso mesmo.

Páscoa, estimados leitores, está centrada na tal paixão de Cristo. Mas paixão aqui no sentido latino, de passio, ou sofrimento. Na paixão de Cristo, o coitado é sovado sem dó por romanos e por quem mais estiver assistindo, e a gente é convidado a compartilhar da pancadaria na condição de quem a sofre. No grande final, o sujeito que veio até aqui para salvar todo mundo dos seus pecados é solenemente crucificado. Essa não é a minha ideia de divertimento, estimados leitores.

Apenas como comparação linguística, compaixão é compartilhar do sofrimento do outro. Na forma germânica, compaixão é Mitgefühl, ou algo assim, significando co-sentir, ou compartilhar dos sentimentos do outro. Eu gostaria muito, muito mais se a gente passasse a comemorar um feriado onde se praticasse o Mitgefühl, e a gente se dedicasse a sentir o outro, e, eventualmente, compreendê-lo, do que passar dias pensando no coitadinho do outro e o quanto ele se sacrificou por nós, sem que a gente pedisse.

Culpa, dor, sofrimento. Essa é a parte do catolicismo que mais me incomoda, o culto ao que existe de pior na vida, a celebração da morte, o que invariavelmente leva a sentimentos de vingança. Meu pobre pai sofre até hoje pelo que ele e os meninos da sua vizinhança faziam no sábado de malhar Judas, instigados pelo padre, quem mais.

Saibam que os romanos crucificavam todo mundo e por qualquer motivo. O cara espirrou torto, pimba, crucifiquem. Madeira e mão de obra custavam pouco, a civilização romana, com toda sua sofisticação, era muito cruel na essência. Não havia nada de especial em crucificar alguém, apenas o horror da coisa, que os contemporâneos viam e temiam. A cruz somente foi adotada pelo cristianismo uns quatro séculos depois de pararem com a prática da crucificação, quando a memória do seu horror já estava distante o suficiente para a cruz poder ser tratada como símbolo, um símbolo muito, muito eficaz. Para que celebrarmos hoje em dia o que existe de pior em uma religião tão preocupada com o sofrimento nesse mundo? Vamos para o outro lado, vamos curtir o feriado imersos em pensamentos mais felizes.

O coelhinho da Páscoa é o meu candidato a se tornar o símbolo da Nova Páscoa. Chocolate é muito melhor enquanto proposta de vida. Estimulante, prazeroso pra caramba, mais saudável do que dizem. E o coelhinho, por diversos motivos, é símbolo do que existe de divertido na vida, não é?

Não que coelhos ovíparos sejam exatamente algo muito racional. Mas, se pensarmos em crenças esquisitas, o mito cristão é tão esquisito quanto, e muito menos feliz. Feriado do Coelhinho, já. Começou a campanha e unam-se a ela, caros leitores.

O mundo era o que era, e é certo lembrar dele como foi, para compreendermos melhor o que nos tornamos. Mas celebrar os seus piores aspectos, eternizando-os em nossa mente coletiva não me parece uma boa maneira de caminhar pela vida, como sociedade.

Guerras, lutas, morte, dureza, fome, constituíram a experiência central da humanidade por milênios, mas lutamos muito e superamos parte desse karma. Existem guerras, existe infelizmente ainda a fome. Mas a maioria dos humanos não está experimentando nada disso e provavelmente nunca irá ter a tristeza de passar por tanta desgraça. Temos vacinas, produzimos comida, criamos sistemas de governo centrados na ideia de que o bem comum deve ser buscado por todos e para todos. Queremos aprender a parar de aquecer o planeta, devastar sua natureza e eliminar a pobreza mais dura. Assim que conseguirmos isso e ainda por cima fizermos desaparecer o axé, estaremos bem. Isso, sim, merece ser celebrado, e creio que o Coelhinho, com sua mensagem de fertilidade e alegria será um ótimo representante do novo feriado.

Enquanto vocês pensam no assunto, vou aqui praticar a felicidade fazendo o meu inigualável chocolate quente, receita do Café Hermés, de Paris, com o maravilhoso chocolate Rey, em pó e em barra, vindo da Venezuela especialmente para essa ocasião.

Quem quiser se juntar a mim nos festejos da Nova Páscoa, é só pedir e eu mando a receita do chocolate quente perfeito. Uma feliz Nova Páscoa a todos, é o que lhes deseja esse seu servo, eu.

Fonte: Terra Magazine