Para quem gosta de cozinhar não é novidade que comida e arte estão relacionadas. A instalação coreográfica do Grupo Terpsi, chamada Casa das Especiarias, surge para, entre outras coisas, confirmar isso. Acho que gostaria de ter sido surpreendida pela proposta, mas o privilégio de ter na família a bailarina Angela Spiazzi, fez com que eu já entrasse sabendo um pouco mais do que se tratava. O que não tirou, porém, nada do prazer de ser uma das 12 pessoas a mesa.
De prato na mão (uma das exigências para participar do evento), olho as fotos na parede e a provocante frase: “o prato que te alimenta é o mesmo que compõe a cena.” A prima nos recebe com um figurino que se assemelha ao das garçonetes. Somos gentilmente conduzidos aos nossos lugares. Aos poucos, no local à meia-luz, vou observando os detalhes do cenário. Panos transparentes nos separam do local onde estão preparando a nossa refeição e de onde os bailarinos fazem as performances. Uma prateleira, cheia de utensílios de cozinha compõem o ambiente.
Se eu sempre achei guarda-chuva um elemento extremamente cênico, o grupo me convence de que pratos também são. Como extensão de seus corpos, eles se movimentam de forma inusitada, poética e divertida. Enquanto isso, nós já estamos com nossos copos de espumante e vamos provando a entrada, o prato principal e a sobremesa, elaborados pela chef Denise Fontoura.
A trilha sonora é calma e profunda. Ao mesmo tempo em que harmoniza o ambiente, instiga, casa com cada braço, cada perna. Imagens e frases são projetadas e se mesclam à pele dos atores e já não sabemos mais o que é o que. No contraste, entramos em contato com ervas como alecrim, canela, erva-doce. Especiarias que nos remetem diretamente à terra, à natureza. Tudo isso atiça também a memória. Lembro do filme Como água para chocolate, onde a experiência gastronômica produzia as mais profundas emoções. E como fazia no cinema, sabendo que ainda haveria mais duas sessões e que os cardápios seriam diferentes, surge a vontade de ficar por lá, mesmo depois dos aplausos para usufruir novamente de todas as sensações que a apresentação provoca.
Acompanhamos os gestos dos bailarinos-atores para recompor a “cena”, incluindo a coreógrafa varrendo o espaço que dali a pouco já vai estar recebendo mais um grupo seleto que vai assistir este novo trabalho do Terpsi que acredito seja uma das propostas mais leves que Carlota Albuquerque já criou, fazendo com que a pimenta se faça presente apenas no cartaz do espetáculo ou, talvez, na minha comida.
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