Thursday, January 22, 2009

Sobre anjos e grilos

Um espetáculo com os textos de Mário Quintana já seria motivo bastante para me agradar. Este poeta gaúcho já está na minha vida há mais de 30 anos, pelo menos. Foi uma das leituras mais importantes da minha vida, com certeza. Decorei vários versos. Fui a uma sessão de autógrafos dele. Comemorei um aniversário na Casa de Cultura Mário Quintana e decorei o texto que ele fala de sua vida para dizer aos convidados. Pedia a cada um desses que também decorasse algo para dizer. Dia muito marcante já que meu irmão que, já não está mais conosco, declamou o poema A Vida:

"a vida são deveres que nós trouxemos para fazer em casa. 
Quando se vê, já são seis horas. 
Quando se vê, ja é sexta feira. 
Quando se vê, já terminou o ano. 
Quando se vê, ja se passaram 50 anos! 
E agora é tarde demais para ser reprovado. 
Se me fosse dada, um dia, outra oportunidade, eu nem olhava o relógio. 
Seguiria sempre em frente e iria jogando, pelo caminho, a casca dourada e inutil das horas. 
Dessa forma eu digo: não deixe de fazer algo que gosta devido à falta de tempo, a unica falta que terá, será desse tempo que infelizmente não voltará mais." 

Além disso, Sobre Anjos e Grilos traz Deborah Finochiaro, a quem admiro também há muito tempo. Estivemos juntas em um Porto Alegre em Cena em Buenos Aires lá se vão mais de 10 anos. Fazia passeios com ela pelas ruas quando ela ficava fazendo sons esquisitos. Eram seus exercícios para voz. Atriz talentosa, disciplinada, dedicada e de tantas outras qualidades.

Juntava-se, ainda a isso (o que já não era pouco) as imagens inéditas projetadas em forma de quadros e animações de Zoravia Bettiol. Uma das poucas artistas plásticas que conheço pessoalmente, a qual respeito e admiro como artista e tenho carinho como amiga. Minha tia trabalhou com ela e Vasco Prado durante muitos anos. Acompanhei, de certa forma, sua trajetória. É uma pessoa que não está só voltada em produzir objetos de arte, mas, em mudar o mundo que vive, utilizando a beleza, a criatividade. Tem uma ong. Faz oficinas com crianças carentes. Participa de movimentos reivindicatórios para uma vida melhor. Resumindo: artista com “A” maiúsculo.

Já no início, Deborah adverte que o espetáculo não vai ser apresentado em seu formato original. Ela machucou o joelho (está com a perna toda enfaixada), mas, para que “ninguém perdesse a viagem” veremos a peça de um novo jeito. Isso não me incomoda. Ao contrário, é bom que tenhamos prova que uma atriz, que tem o compromisso de estar no palco, está sujeita a todas as intempéries da vida.  

Preciso destacar que Deborah é muito forte no palco. Sempre foi. Tem uma incrível presença cênica. Muito carisma. Deveria ensinar todos os atores e atrizes de Porto Alegre e, por que não, do Brasil a dizer um texto. Cada palavra é pronunciada com uma sensação, um jeito, um sentimento que vem grudado nela de uma forma que raramente vejo acontecer nos palcos. Algo, realmente, fascinante.

Mas, não sei se foi o excesso de ar-condicionado da sala (o que fez algumas pessoas trocarem de lugar e outras se encolherem nas cadeiras), mas, achei que seria emocionante e não foi. Pelo menos, não para mim. Eu que choro até com comerciais de tv! Achei lindas algumas imagens. Admirei vários efeitos cênicos criados pela grande tela no fundo do palco e o corpo da atriz. Fiquei encantada com o jogo de luz e sombra como um recurso artístico. Mas, não mexeu comigo... Ainda estou tentando descobrir exatamente por que, mas, resolvi não esperar para escrever porque isso pode demorar muito. Entendi, porém, que tem a ver com algo da poesia do próprio Quintana. Percebi isso por ter alguns textos que aparecem gravados  pelo ator Paulo José e, não que eu o quisesse a dizer todos os textos, mas, ele, como ator, representa muito de Quintana na poesia. Algo minimalista. Algo que está intrínseco em sua atuação. Paulo José quando atua não faz “caras e bocas”. Não reage de modo exagerado. É algo no olhar dele, num pequeno gesto, que traduz tudo que ele está ali para dizer.

Pois bem. Mário Quintana, na minha leitura, também tem esse minimalismo. A força das palavras dele, do cômico ao emocionante está em um jeito de escrever que vem aos poucos, devagar, de uma forma muito sutil. Ele não faz estardalhaço das palavras. Não as atira ao vento. É como se ele fosse as colocando devagar por baixo da porta.  Acredito que tenha sido isso. Na ótima performance de Deborah isso mudou para mim e me causou uma estranheza que foi mais forte do que os meus sentimentos. Além disso, como já disse antes, minha paixão pelo Quintana me fez ter meus versos preferidos e, é óbvio, muitos não estavam lá. Claro que isso é muito pessoal e não deve induzir ninguém a deixar de ver o espetáculo que eu recomendo. De qualquer forma, coloco aqui um verso que, talvez, traduza o que quero dizer com a maneira que eu vejo o poeta:

Se tu me amas, ama-me baixinho
Não o grites de cima dos telhados
Deixa em paz os passarinhos
Deixa em paz a mim!
Se me queres,
enfim,
tem de ser bem devagarinho, Amada,
que a vida é breve, e o amor mais breve ainda...

Coloco também as premiações recebidas para mostrar que, independente, da minha impressão pessoal, é um espetáculo que tem recebido a apreciação de muitos especialistas.

PREMIAÇÕES

Prêmio Quero-Quero SATED/RS 2006 de Melhor Atriz;

Prêmio de Melhor Espetáculo, Melhor Cenário, Melhor Trilha Sonora e Melhor Atriz no XIV Festival Nacional de Teatro de Florianópolis Isnard Azevedo 2007;

Prêmio de Melhor Atriz no VII Festival de Teatro de Resende 2007;

Prêmio de Melhor Atriz e Júri Popular Melhor Espetáculo no 35° FENATA - Festival Nacional de Teatro de Ponta Grossa 2007;

Prêmio de Melhor Espetáculo, Melhor Atriz, Melhor Texto Adaptado e Prêmio Especial do Júri para Zoravia Bettiol no 2º FENAT - Festival Nacional de Teatro de Campos dos Goytacazes 2007

 Ficha Técnica

Textos e Poemas - Mario Quintana

Concepção, Roteiro e Interpretação - Deborah Finocchiaro

Direção - Deborah Finocchiaro e Jessé Oliveira

Imagens - Zoravia Bettiol

Trilha Sonora Original - Chico Ferretti 
(Com exceção das músicas Ecogliter, de Laura Finocchiaro e Franco Jr, e trechos das músicas Baleada Noturna, de Lory Finocchiaro, 4ª Sinfonia de Mahler e Concertos de Brandenburgo n° 4 e 5 de Johann S. Bach)

Voz em Off - Paulo José

Iluminação - Fabrício Simões e Jessé Oliveira

Figurino - Raquel Cappelletto

Programação Visual - Ricky Bols

Técnico de Som e Imagens - Zé Derli Rodrigues

Técnico de Luz - Fabrício Simões

Assistência de Produção (RS) - Vanice Schuler

Produção Executiva (RS) - Elisete Idalgo e Deborah Finocchiaro

Produção Executiva (SP) - Fernando Padilha e Clarissa Rockenbach

Direção Geral - Deborah Finocchiaro

Realização - Companhia de Solos & Bem Acompanhados

www.sobreanjosegrilos.com.br

www.zoraviabettiol.com.br

http://www.deborahfinocchiaro.com/

 

 

2 comments:

  1. nossa...

    acho qeu tivemos a mesma sensação na peça!!!

    tou pensando em começar a colocar a ficha técnica das peças... mas me dá uma preguiçaaa...

    o qeu tu acha, heim?

    ReplyDelete
  2. Acho que acrescenta algumas informações interessantes e ajuda a divulgar o trabalho dos colegas. As pessoas precisam saber que um espetáculo não surge do nada, não é mesmo?

    ReplyDelete