Quando eu ainda estava no
Departamento de Artes Dramáticas, fui duramente criticada pelos colegas nas
redes sociais por dizer que eles eram pretensiosos por quererem, já de início,
fazer espetáculos a partir de textos de dramaturgos famosos, clássicos como
Romeu e Julieta, as Gaivotas, etc. Ainda penso que certas obras exigem
maturidade do ator e não estou falando aqui de idade, mas de experiência, de
ensaios, de preparação. Então, foi com surpresa que recebi o trabalho do
diretor Igor Ramos em O mágico de Oz, apresentado pelos alunos da Escola
Cecília Meireles, no Festival de Teatro Estudantil.
Como diz no programa, livremente
adaptado da obra de L. Frank Baum e que já foi montada muitas vezes por grandes
companhias internacionais, transformada em filme... Assim, parecia um desafio enorme
para estudantes. Não pela capacidade dos professores, mas pelas circunstâncias,
horário das aulas, espaços, etc.
Sem cenário, o espetáculo se
baseia nos atores que, na mão de uma direção precisa, com as cenas bem
definidas e mantendo o essencial da história, deixa tempo para observar o trabalho
corporal intenso e, ao mesmo tempo, delicado do espantalho. Algo realmente
difícil de fazer e que exige muito da atriz. Também vemos a flexibilidade do “cão”
de Dorothy, a menina protagonista que conduz as cenas com segurança e mantém o
equilíbrio de todos os demais.
O figurino deixa claro quem eles são
e ganha toques especiais na bruxa e no homem lata, ambos divertidos e, enquanto
o texto aparece reduzido, cresce a força da cena e os poucos elementos como os
sapatos de Dorothy, a corda e o caldeirão da bruxa, a latinha de óleo do homem
de lata vão destacando os cuidados desse trabalho.
A plateia, adultos e crianças,
entram nesse universo de fantasia em que a luz tem também um papel importante
e, quando estamos todos envolvidos, é justamente essa que falta no teatro e
deixa todos nós no escuro para frustração, tanto do público, como dos atores.
Ninguém quer ir embora. Ninguém quer o cancelamento. Sugiro aplaudir os atores,
mas nem isso acontece, pois representaria de fato o fim da expectativa. Subo no
palco e cumprimento os atores pelo trabalho. As lágrimas escorrem nos rostos de
alguns e molham a maquiagem. Não tenho
dúvidas de que é essa paixão, essa vontade que chegava até nós. A luz volta.
Eles também. Resgatam a mesma força cênica de antes e vão até o final. Saímos
com um sentimento de conquista, de vitória contra uma adversidade que revela
tão “claramente” uma das características mais importantes do teatro: a
imprevisibilidade.
Sentada do lado de fora, uma
menina vem em minha direção e só a identifico pelo comentário que ela faz. Era
o “cão” agora sem maquiagem e sem lágrimas. Creio que ela ainda nem sabe que
ser ator é isso, fazer o personagem ocupar nossas vidas e nos transformar por
fora, mas, principalmente, por dentro. Logo depois, vem o diretor que fala da
sua satisfação em ter visto seu mestre na plateia. Sem dúvidas, o que Igor
Ramos apresentou no teatro Renascença comprova que Luis Paulo Vasconcellos
conseguiu mesmo repassar seus ensinamentos no curso de direção. Por tudo isso, me
vejo pensando que Shakespeare, assim como todos os grandes mestres de teatro
foram estudantes um dia e, assim como Dorothy, volto para minha casa me sentindo mais inteligente, como o
espantalho, com coragem para continuar buscando um caminho, como o leão, e com
ótimos sentimentos, como o homem de lata. Tudo isso provocado pela arte que nos
tira da escuridão.