Depois de Paris, Buenos Aires sempre foi a cidade preferida
de minha mãe. Com quatro filhos, meus pais não tinham, exatamente, férias, mas,
eventualmente, conseguiam roubar alguns dias para visitar a capital Argentina.
Crescemos ouvindo histórias de seus dias caminhando pela 9 de julho,
Corrientes, Suipacha, Santa Fé e sobre suas compras que, para nós, significavam
pirulitos gigantes e chocolates suíços.
Não cansamos de contar aos amigos a história do dia em que
minha mãe saiu do hotel, comprou toda uma roupa nova, uma peruca e, ao voltar,
foi barrada por um recepcionista que não a reconheceu. Assim, acabamos querendo
vir com eles algumas vezes e, nos últimos anos, tenho tido a chance de voltar
seja sozinha ou em família.
Não dá para apagar esse afeto que tenho por essa cidade de
ruas largas e prédios de arquitetura tão semelhante à francesa. O que, aliás,
não é à-toa, já que muitos foram mesmo projetados por profissionais europeus.
Por isso, entendo, perfeitamente, o desejo de minha mãe de ir comemorar o aniversário
lá.
Menos de duas horas de Porto Alegre e estamos hospedadas em
um hotel a poucas quadras do Obelisco. O que, como diz uma das minhas irmãs é a
Tour Eiffel portenha. Descobri esse local na internet e temos sido bem
acolhidos por uma diária menor do que muitos hotéis no interior do RS. Boa
cama, bom banho e medialunas no café da manhã, entre outros tipos de bolo que
minha mãe tanto adora.
No mais, é seguir pelas ruas planas e ver lindas praças,
beber vinho e comer milanesas e empanadas. Sim, na hora de pagar pelas
refeições sabemos que estamos muito distantes daqueles anos tão vantajosos para
os brasileiros. Não importa se, no câmbio, cada real vale mais de três pesos,
tudo também triplica de valor. Não vale mais a pena comprar nem roupas, nem sapatos,
nada. Ainda é possível achar um pequeno objeto diferente e interessante por um
valor razoável para não voltar de mãos vazias para os parentes e amigos. Mas, é
só.
Tem sujeira nas ruas e, não é de agora. Assim como gente
pedindo ou dormindo nas calçadas. Mas, o movimento intenso de gente nos bares e
restaurantes até depois da meia-noite faz com que tenhamos a impressão de que
estamos mais seguros do que em nossa própria cidade. Talvez, não seja bem
assim. Talvez, seja mais uma questão de hábito que eles ainda mantenham como o
cigarro, a leitura nas ruas e o costume de comprar flores ou ir ao teatro.
Esses, aliás, em quantidades absurdas e com enormes filas. E, enquanto eles
ganham toda a minha simpatia por esse desejo de cultura, o contrário não acontece.
Eu, que busco sempre entender o comportamento alheio, observo o jeito nada
sorridente dos argentinos de Buenos Aires e relevo o atendimento quase
agressivo, principalmente nos mercados e serviços, o que transforma um simples
sorvete em uma experiência de paciência e compreensão.
Sei que os argentinos estão ressentidos da sua situação e a
enxurrada de brasileiros que transita para lá e para cá não é exatamente o que
eles queriam, mas todo cidadão deve saber que turistas trazem divisas para o
país e, mesmo que eu não esteja lá para resolver nenhum problema econômico e,
nem mesmo para pensar no que significa essa alta inflação, nós também temos
nossos próprios problemas e a vontade de escapar deles indo para a cidade
vizinha.
E como acreditamos na vida após a morte e já doamos o corpo,
fizemos um acordo de que quando uma de nós se for, a homenagem será, se for
verão, derramar as lágrimas de saudade no mar ou, no inverno, com uma bela
garrafa de vinho e Buenos Aires é sempre um bom destino para isso.